Traduzir

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

16 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres

Hoje, 20/11, Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, será o lançamento da campanha 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres.

Durante os dias de ativismo, a violência obstétrica será uma pauta recorrente, que percorrerá diversas comunidades em Florianópolis, dando visibilidade ao tema.

Tod@s estão convidados a participar dos ciclos de palestras, começando hoje, às 15h30.

Abaixo as datas, locais das palestras sobre VO e demais informações:


20/11/14 (quinta feira)
Localidade: Alto da Caeira
Endereço: Servidão da Felicidade – Recicla Floripa (no galpão do centro de reciclagem)
Horário: 15:30 horas
Profissional: Juliana Souza - Formada em Educação Física pela UFSC 2011. Professora de Hatha Yoga e Pilates. Doula pelo GAMA em 2014

20/11/14 (quinta feira)
Localidade: Penitenciária (Agronômica)
Endereço: Igreja Católica Nossa Senhora Aparecida
Horário: 19:30 horas
Profissional: Gerusa Santini. Fisioterapeuta. Doula e educadora perinatal certificada pela Matriusca Bem estar das mulheres em todos os ciclos de vida; Voluntária no Gestar - Grupo de Apoio à gestante; Ativista no movimento pela humanização do parto e nascimento.

25/11/14 (terça feira)
Localidade: Serrinha
Endereço: Casa São Jose - Marcus Aurélio Homem, 366 - Horário: 19:30 horas
Profissional: Celina Lazzari - Doula e Educadora Perinatal formada pela Matriusca - Psicóloga e Bacharel em Psicologia formada na Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina. Trabalha como Doula e Psicóloga Clínica.
Camila Lazzari Trentini - bacharel em direito e ativista pela humanização do parto e nascimento.

27/11 (quinta feira)
Localidade: Morro do 25 (centro de Floripa)
Endereço: Salão da Igreja
Horário: 19:00 horas
Profissional: Karine Kerr - ativista pelo direito das mulheres.

01/12 (segunda feira) 
Localidade: Queimada e Jagatá
Endereço: Igreja São Sebastião
Horário: 19:00 horas
Profissional: Marina Toledo - doula e educadora perinatal formada pela Matriusca - Bem estar das mulheres em todos os ciclos de vida; Voluntária no Gestar - Grupo de Apoio à gestante; Ativista no movimento pela humanização do parto e nascimento.Voluntária no Grupo Mulheres no Alpha. Ativista no movimento pela humanização do parto e nascimento. Realiza pintura artística na barriga da gestante.

02/12 (terça feira)
Localidade: Monte Serrat (centro, atrás da escola Técnica)
Endereço: Centro Cultural Escrava Anastácia
Horário: 19:30 horas
Profissional: Maysa Vicente - Doula e Educadora Perinatal pela Matriusca em associação com a Rehuna; Técnica em Enfermagem na Unidade de Pronto Atendimento do Sul da Ilha pela PMF , Voluntária no Gestar - Grupo de Apoio à gestante; Ativista no movimento pela humanização do parto e nascimento.


http://violenciaobstetricasc.blogspot.com.br/2014/11/violencia-obstetrica-nos-16-dias-de.html

"Com uma parceria firmada por Gisele Corrêa e Mariana Andrade com a Secretaria de Habitação e Saneamento da Prefeitura de Florianópolis, o assunto violência obstétrica será levado a um público diferenciado. A adesão de profissionais nessa causa foi fundamental para que essa parceria fosse um sucesso!"


Fanpage da Coordenadoria da Mulher de Florianópolis: https://www.facebook.com/pages/Coordenadoria-da-Mulher-de-Florian%C3%B3polis/1437304883204527?fref=ts

domingo, 28 de setembro de 2014

Por onde saem os filhos?

Original em Revista TPM
Por Natascha Cortêz

O nascer no Brasil: Tpm ouviu histórias de diferentes partos (normal, cesárea, em casa)


A natureza diz que é pela vagina. Mas, se considerarmos o número de cesáreas feitas no Brasil, podemos dizer que é por um corte na barriga. Tpm ouviu histórias de diferentes partos (normal, cesárea, domiciliar) e o que os especialistas pensam sobre o nascer no Brasil. Tudo pra tentar entender: de quem é o parto e de quem deveria ser?


Segundo informações do Ministério da Saúde, um dos principais desafios das políticas voltadas para a saúde da mulher é a mudança do modelo que fez do Brasil campeão disparado em cesáreas. A maior pesquisa nacional já realizada, Nascer no Brasil, publicada em maio pela Fundação Oswaldo Cruz, confirma a preocupação do órgão: cruzamos a linha dos 52% de partos cirúrgicos na rede pública. Nos hospitais privados, o índice pode ultrapassar os 88%. Percentuais muito distantes dos 15% recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). São quase 1 milhão de brasileiras submetidas a partos cirúrgicos todos os anos. Contudo, o mesmo estudo diz: 73% das entrevistadas declararam desejar o parto vaginal no início da gravidez.
O que acontece para que essas mulheres não consigam realizar o parto que queriam? A pesquisaMulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado, da Fundação Perseu Abramo, de 2010, dá uma pista: uma entre quatro brasileiras disse ter sofrido violência no parto. E, como explica a obstetra Carla Polido, “violência obstétrica vai muito além de tratamento desumano. Ser privada do contato com o bebê ou receber ocitocina sintética para acelerar o trabalho de parto apenas por conveniência médica também é violência”. Ao se depararem com as duas opções, cesariana e parto normal, ambas permeadas por violência, não é de espantar que as brasileiras prefiram a alternativa mais rápida – no caso, a cirúrgica. “Entre ser maltratada por 12 horas e ser maltratada por meia hora, qual parece mais fácil?”, indaga Raquel Marques, sanitarista e presidente da Artemis, instituição que promove políticas públicas para um nascer mais digno.

Dois filhos > uma cesárea e um parto normal

Olivian Moioli
Wanessa Camargo no parto do segundo filho
Wanessa Camargo no parto do segundo filho
“Tenho pavor de anestesia. Fiz tudo pra poder ter um parto normal na primeira gravidez, esperei entrar em trabalho de parto, fiquei 12 horas nele, mas não tive dilatação. Na época, meu médico disse que meu filho estava em sofrimento fetal. Fizemos uma cesárea. Chorei muito antes da cirurgia, pois queria muito o parto normal. Na cesárea, tive uma reação terrível à anestesia e odiei o pós- operatório. Fiquei 40 dias em casa sem conseguir me esticar, não conseguia fazer nada. Na minha segunda gravidez, novamente queria parto normal, mas não criei expectativas. Acabei trocando de médico, escolhi um defensor do parto normal e fiquei em uma sala de parto humanizado. Foi muito cansativo, mas faria tudo de novo 10 mil vezes. Ouvi muita história bobona pra me dar medo, mas meu médico me tranquilizou em relação a esses mitos todos. Foi aquele parto de novela mesmo, demorado, exaustivo, mas nunca pensei em desistir. No dia seguinte eu estava de pé, já andava e brincava com meu filho mais velho. Até o leite desceu mais rápido. Tive as duas experiências, e não tem comparação, o parto normal é muito melhor. Se precisasse ter outra cesárea, não sei se gostaria de ter outro filho.” -WANESSA CAMARGO, 31 ANOS, CANTORA  

Dois filhos > dois partos normais no hospital

Arquivo Pessoal
Leticia Spiller no parto de Stella
Leticia Spiller no parto de Stella
“Sempre me informei sobre parto. Nascer é um sofrimento no mundo ocidental. O ar-condicionado gelado, aquela luz azul e a instrumentalização hospitalar deixam tudo mais cruel. O que pude fazer pra deixar meus partos mais aconchegantes, fiz. Eu tinha 23 anos na primeira gravidez, e 37 na segunda. Os dois partos foram normais e em hospitais. Eu queria ter todos os recursos necessários caso acontecesse alguma coisa, sabe? Mas pedi que demorassem pra cortar o cordão umbilical, abaixassem a luz, desligassem o ar-condicionado e respeitassem meu tempo. Acabei tomando anestesia em um último momento, fiz uma força e, a Stella, minha segunda, nasceu sem dificuldade. Fiquei muito tranquila nas duas vezes e acho que isso ajudou muito. Me preparei bastante para poder fazer os partos. Tenho amigas bem jovens que já deixam a cesárea marcada, não entendo isso.” - LETÍCIA SPILLER, 41 ANOS, ATRIZ

Parto não é produto

"A brasileira está largada à própria sorte quando o assunto é assistência ao parto, sejam aquelas que usam o Sistema Único de Saúde ou as que usam a rede privada através de convênios médicos. Não existem notícias boas para essas mulheres. É muito triste quando o parto domiciliar é falta de opção, e não escolha, por exemplo. Quando uma mulher mora em uma área afastada e não consegue chegar a um hospital, se ela tiver pressão alta, se for gravidez de gêmeos, não pode ser domiciliar. Casos assim exigem uma UTI neonatal e outra para a mãe. A questão está na maneira como o parto é tratado. Quando temos um problema e não reclamos por políticas públicas que melhorem a vida de todo mundo, passamos a reivindicar pelo que pagamos e pelo que podemos comprar. Enquanto nos portarmos como consumidores, seremos tratados como tais e só receberemos serviços à medida que somos economicamente interessantes.” - RAQUEL MARQUES, PRESIDENTE DA ARTEMIS, INSTITUIÇÃO QUE PRESSIONA O PODER PÚBLICO E PROMOVE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA UM NASCER MAIS DIGNO

Insegurança médica

“Os estudantes de obstetrícia saem da faculdade como excelentes cirurgiões
e com pouquíssimo conhecimento da realização de um parto vaginal, saem com menos mão e superinseguros. Não podemos negar que a cesariana também
é um procedimento mais interessante tanto para o médico quanto para o hospital, por ser um evento previsível, com hora marcada, rápido e passível de maior controle. Porém, deveria ser uma alternativa de emergência para salvar vidas. Ainda temos o fato de as brasileiras serem pouco informadas a respeito do parto e acreditarem em falácias que envolvem sobretudo o medo de uma dor extrema e o da alteração de sua vagina.
A queixa de ‘alargar’ a vagina é comum, mas para isso existe a fisioterapia urogenital, que parece pompoarismo, só que tecnológico. Toda mulher tem acesso a ela, do SUS ao Einstein. Além
do mais, o parto vaginal implica em menores riscos de morte para mulheres
e crianças, aleitamento prolongado e melhor prognóstico gestacional para futuras gravidezes. O sofrimento fetal, só possível com o trabalho de parto, produz uma membrana que protege o brônquio da criança. Outro benefício é que esse parto é apertado para o bebê, a pressão no seu tórax faz com que ele elimine o líquido amniótico que fica retido nas vias aéreas superiores.” - 
RENATO KALIL, GINECOLOGISTA E OBSTETRA DO HOSPITAL ALBERT EINSTEIN EM SÃO PAULO 

Um filho > parto em casa (e esperando o segundo)

Arquivo Pessoal
Mariana Maffei após seu primeiro parto
Mariana Maffei após seu primeiro parto
“Desde que conheci o parto domiciliar, soube que era pra mim. Me sentia preparada por conta de um pré-natal bem-feito e das leituras que fiz sobre o assunto. Uma verdade: imaginava que teria muito menos dor. Ela é como uma cólica forte, só que por muito tempo. A dor vale a pena, faz parte do processo de se tornar mãe. Meu parto foi assistido por uma doula e duas parteiras, mas, na hora que meu filho nasceu mesmo, só estava a doula. Nem meu marido estava no quarto. O nascer domiciliar é completamente natural, não há medicação alguma. Uma mulher que quer parir em casa quer viver a dor e o parto.Otesãoquevocêtemao viver um parto natural é o de se sentir protagonista daquilo. Estou grávida novamente, vai nascer em breve, e quero ter em casa outra vez, não abro mão.” - MARIANA MAFFEI, 31 ANOS, EMPRESÁRIA

Um filho > um parto roubado 

Arquivo Pessoal
A bebê de Juliana Leandro
A bebê de Juliana Leandro
“Assim que soube que estava grávida de minha primeira filha, prometi a mim mesma: faria parto normal. Passava os dias lendo sobre tudo que se relacionava a parir. Queria me munir de informações, porque sabia o quão difícil era conseguir realizar o procedimento no Brasil. Apesar de ter seguido os passos recomendados para conseguir um parto normal, minha filha nasceu por uma cesariana. Desnecessária, como descobri mais tarde. Foram 12 horas de trabalho de parto, as contrações corriam como o esperado e tudo caminhava para o desfecho que planejei. Ainda assim, minha vontade foi negligenciada. Sentia minha filha fazendo força pra sair. Então, uma enfermeira brutalmente proibiu que eu ficasse de cócoras, uma necessidade que sentia. Estava vulnerável e não soube me defender. A justificativa que recebi foi que meu bebê passava por sofrimento fetal e uma cesárea precisava ser feita com urgência. Não vi saída a não ser autorizar o procedimento. Fui levada para a sala de cirurgia e em meia hora tudo aconteceu. Tive um parto roubado. Depois, analisando o prontuário, descobri que meu bebê tinha uma frequência cardíaca perfeita para o parto normal. Me senti enganada. O tratamento que tive foi, sim, violência obstétrica.” - JULIANA LEANDRO, 32 ANOS, BANCÁRIA 

Violência obstétrica vai muito além de tratamento desumano

“A violência obstétrica é consequência direta da medicalização do parto. Durante anos, intervenções no processo fisiológico de nascimento vêm sendo realizadas como regra de assistência, quando deveriam ser utilizadas apenas de acordo com necessidades específicas. O uso inadequado de procedimentos caracteriza a violência obstétrica, que vai além de tratamento desumano. Uso de soro com ocitocina sintética para aceleração do trabalho de parto por conveniência médica e hospitalar, exames de toque sucessivos feitos por diferentes pessoas, episiotomia (corte entre a vagina e o ânus para aumentar canal de passagem do bebê) e privação do contato imediato entre mãe e filho após o nascimento são formas de violência. O parto ‘humanizado’ (termo, na minha opinião, equivocado e sujeito a interpretações dúbias) é o parto em que nenhuma intervenção é feita sem necessidade, um parto em que a mulher é corresponsável e, pactua todas as condutas e é a personagem principal do processo que gira em torno dela e da criança. Não sou de forma nenhuma contra a cesariana com indicação médica, mas não realizaria o procedimento eletivo sem motivo. Acredito que as mulheres têm o direito, sim, de escolher a cesariana. Mas, para a opção consciente, elas precisam saber de todos os riscos envolvidos, e, na minha experiência, sei que mulheres informadas não escolhem cesarianas.” - CARLA POLIDO, OBSTETRA E PROFESSORA ASSISTENTE DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS 

Quatro filhos > dois partos de cócoras e dois por cesária

Arquivo Pessoal
O segundo parto de Lila Ananda
O segundo parto de Lila Ananda
“Quando engravidei pela primeira vez, quis parto normal. Doeu muito. Menos de dois anos depois tive meu segundo filho, em hospital, com a mesma médica, novamente de cócoras. Imaginava que quando tivesse o terceiro seria na água. O pré-natal não foi tão bom como os dos primeiros e fiquei apreensiva. Tive um mal-estar com 40 semanas e acabei no hospital. Lá, me consultei com um cesarista assumido que me explicou como seria se escolhesse a cirurgia. Optei pela cesárea. Foi muito tranquilo. A recuperação foi boa e eu pude entender as mulheres que escolhem o procedimento. Quando engravidei pela quarta vez tive certeza: faria cesárea, mesmo se não tivesse indicação. Só não esperava entrar em trabalho de parto dois dias antes, foi a primeira vez que isso aconteceu, meus dois primeiros foram induzidos. Cheguei ao hospital com contrações e desabei diante do médico. Disse a ele: ‘Pelo amor de Deus, não me obrigue a ter um parto normal, eu já passei por isso’. Ele pediu ao médico de plantão, que aceitou operar. Passei mal na mesa de cirurgia e fiquei com medo de morrer. Minha pressão caiu muito e achei que não conheceria minha filha. Se recomendo parto normal ou cesária? Depois de tudo que passei, acho que parto é igual a orientação sexual, não se deve opinar na do outro.” - LILA ANANDA, 25 ANOS, ARTISTA PLÁSTICA 

O corpo é poderoso

“No Brasil, muita coisa precisa mudar. Os planos de saúde precisam adequar suas estratégias e tornar o parto normal mais atraente para o médico conveniado. Os hospitais precisam criar estruturas facilitadoras de um parto humanizado, disponibilizando recursos, como banheira, bola, banqueta e um ambiente acolhedor para toda a família. Os profissionais de saúde precisam reciclar suas práticas e prestar um atendimento coerente com a medicina baseada em evidências, que está de acordo com tudo o que é preconizadopelo movimento da humanização do nascimento. As agências reguladoras precisam fiscalizar e punir as cesarianas e intervenções realizadas sem uma boa indicação. Mas, principalmente, as mulheres precisam derrubar mitos e medos, exigir seu direito de serem respeitadas e acreditar mais na natureza e no poder de seu corpo.” - ÉRICA DE PAULA, PSICÓLOGA, DOULA E PRODUTORA DO FILME O RENASCIMENTO DO PARTO

http://revistatpm.uol.com.br/revista/146/reportagens/por-onde-saem-os-filhos.html

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Como é nascer no Brasil?

Por Simone Diniz, médica obstetra PhD
Texto retirado da fanpage O Renascimento do Parto - O Filme


Primeiro nasce-se cada vez menos. A gente teve uma queda muito acentuada de nascimentos no Brasil. E quanto mais escolarizada e maior a renda, menor a fecundidade. No caso brasileiro, o parto é muito medicalizado e muito marcado pela hierarquia social da mulher. Para algumas questões de saúde, como para quem tem HIV, precisa de um antirretroviral ou de uma cirurgia, você tem o mesmo procedimento público e privado, existe um padrão do que é considerado como aceitável. Para o parto, não. A gente tem uma assistência ao parto que para as mulheres de menor renda e escolaridade e para aquelas que o IBGE chama de pardas e negras, muito diferente do das mulheres escolarizadas, que estão no setor privado, pagantes.

Normalmente as mulheres de renda mais baixa no Brasil têm uma assistência sem nenhum direito a escolha sobre procedimentos e os serviços atendem para um parto vaginal com várias intervenções que não correspondem ao padrão ouro da assistência como ficar sem acompanhante. No setor público é pior, mas vamos levar em conta que no setor privado 70% das mulheres nem entra em trabalho de parto. Muitas mulheres são mantidas imobilizadas e recebem, em algum momento do trabalho de parto, alguma droga para induzir ou acelerar, a ocitocina sintética principalmente. O uso de ocitocina deveria ser extramente cuidadoso, porque ela tem vários efeitos adversos como, por exemplo, tornar a contração artificialmente intensa e muito dolorosa. Então as mulheres frequentemente descompensam emocionalmente. E alguns procedimentos invasivos que não deveriam ser usados, a não ser com extrema cautela, são usados livremente como o descolamento das membranas, que é muito agressivo, doloroso, aumenta o risco de lesão de colo e infecções e a ruptura da bolsa, como aceleração do parto. É uma ideia de produtividade que parte do pressuposto que o parto é um evento desagradável, degradante, humilhante, repulsivo, sujo e que, portanto, deve ser encurtado.

Isso no sistema público, não é?

Sim. E quando você chega no período expulsivo é imobilizada deitada. Outras pesquisas mesmo antes da “Nascer no Brasil” já mostraram que 90% das mulheres dão a luz imobilizadas deitadas de costas, que é uma posição que é antifisiológica, prejudica a mãe e o bebê, recebem uma manobra que empurra a barriga da mulher, sem contar a episotomia. Então mais da metade das mulheres sai com uma sutura genital, se não sair com uma abdominal. Raramente uma mulher sai do parto sem uma sutura. É um parto com intervenções desnecessárias, agressivas e dolorosas, em ambientes inóspitos e vexatórios, com procedimentos e rotinas degradantes, exposição da privacidade, tratamento insensível, rude e abertamente violento como muitas mulheres têm mostrado.

E com diferenças que passam pelo gênero, condições socioeconômicas, cor da pele…

As questões de gênero cruzam com as questões socioeconômicas. Existe uma ideia de que o sofrimento no parto é uma punição legítima pela mulher ter transado. Isso é muito repetido. O próprio ministro da Saúde disse publicamente, mais de uma vez, que durante a formação dele, o professor fazia esse tipo de violência verbal de caráter sexual com as mulheres, aquela coisa do “na hora que fez você não gritou”. Como diz o movimento feminista, “parto violento para vender cesárea”. Além disso, é muito raro que um profissional, independente da formação, tenha visto um parto espontâneo, fisiológico, planejado. Ele pode ter visto um que nasceu no corredor, no taxi, mas um que tenha sido planejado para isso ele nunca estudou.

Então para esse profissional, que aprendeu que as mulheres se beneficiam dos procedimentos, essa é a ideia de assistência ao parto. Para o sistema público é um: manejado, com hormônios, etc. No setor público, as mulheres não podem escolher porque essa escolha deve ser feita com base em critérios clínicos do que é seguro e apropriado para ela. No setor privado, considerando que as mulheres são mais escolarizadas e estão pagando, elas têm direito a autonomia. É uma autonomia relacionada à condição de pagante. No setor privado parte-se do mesmo pressuposto que o parto é uma coisa humilhante, primitiva, coisa de pobre, que vai danificar o períneo, que vai comprometer. É muito parecido com o conceito religioso de indulgência, como você paga, a gente pode fazer um desconto no seu pecado. E aí você pode fazer um bypass do trabalho de parto. Atualmente aceita-se internacionalmente que os melhores resultados para a mãe e para o bebê são aqueles do parto fisiológico e espontâneo, que se inicia, conduz e termina sem uso de intervenções. Defendo muito ardentemente o direito de escolha das mulheres. Mas precisa ser o direito de escolha informado.

Mas qual escolha? A da via de parto ou dos procedimentos? Porque se a gente não escolhe fazer uma cirurgia para retirar o apêndice, por que deveria escolher a cesárea? Não deveria ser apenas por indicação clinica?

A escolha tem que ser informada. Não existe escolha fora do seu contexto social. Vamos dizer que você mora em uma cidade e ninguém atende parto normal. No SUS é ocitocina, episotomia, Kristeller (manobra que consiste em empurrar a barriga). Se cair em um hospital escola, sua vagina vai passar pelo toque coletivo. Qual é a alternativa? A cesárea. Não existe escolha livre nesse sentido. No Brasil, a crença mesmo nos setores acadêmicos é que o parto vaginal é horrível e que a cesárea é a alternativa superior. Não adianta que toda evidência mostre o contrário. Evidência de curto prazo: aumento de risco na transição fetal neonatal. Existe muito mais segurança nos partos fisiológicos do que nas cesáreas. O bebê tem menor chance de ir para uma UTI neonatal, de ter problemas respiratórios, metabólicos, infecção – ele tem o melhor prognóstico de todos. No longo prazo a gente sabe que o trabalho de parto em si desempenha um papel muito importante na ativação de certos sistemas orgânicos para a transição. Como o bebê nasce estéril, livre de bactérias, à medida que entra em contato com as bactérias da vagina durante o parto, ele será colonizado e isso desenvolverá um sistema imune muito mais saudável do que se nascer de cesárea e for contaminado por bactérias hospitalares. Esse é conhecimento recente, mas já saíram pesquisas sobre risco diferenciado de asma, diabete, obesidade e uma série de doenças crônicas na infância e no longo prazo, porque a programação metabólica da criança é altamente dependente dessa colonização. Isso é muito importante.

Quando eu falo de escolha informada é informar sobre tudo isso. E é um problema ter os profissionais como fonte de informação porque eles desconhecem esse tipo de coisa. Porque ignoram ou porque não acreditam. Não é que ele engana a mulher, o filho dele nasce de cesárea! A cesárea é um recurso muito importante em todos os sistemas de saúde materna. Mas o que a gente faz no Brasil é pessimizar o parto para vender cesárea. Existe um conflito de interesses, as pessoas não querem que o parto melhore. Eles se livraram da imprevisibilidade do parto espontâneo através da eliminação do trabalho de parto. O que eles oferecem de plus para competir entre si? A festa! Porque o parto é um momento ritual onde o lugar da mãe e do bebê são marcados socialmente. Seja paciente do SUS, solteira, pobre, não branca, trabalhadora do sexo que vai parir no amparo maternal até a mulher de classe altíssima no hospital mais elegante. O lugar que você dá a luz é um marcador desse seu lugar social. Essa ritualística pesa muito e reflete os valores que a gente quer transmitir para as próximas gerações. Os padres já diziam que para Deus manifestar seu horror ao corpo ele tinha feito as pessoas nascerem entre urina e fezes. E, veja só, esse contato bacteriano que é o bacana!

Há diferenças regionais?

Elas estão se diluindo cada vez mais. As maiores taxas de intervenção são em regiões mais ricas: sul e sudeste. Centro este fica no meio seguida de nordeste e norte, quando você ainda tem um grande número de partos domiciliares com parteiras tradicionais.

Nos centros urbanos, o relato de violência é maior. As pessoas acreditam que isso é porque as mulheres urbanas identificam melhor essa violência e também nas comunidades menores as pessoas sabem quem é quem. A violência precisa de uma certa impessoalidade. A violência também é mais comum entre as mulheres mais pobres, menos escolarizadas, as negras e as pardas e as mulheres mais jovens. Em geral essas pessoas são mais maltratadas. É como se a gente tivesse uma hierarquia de respeitabilidade materna.

Aliás o pré-natal é outro período critico de desinformação, não?

O pré-natal na década de 1980 era a coisa mais linda. Com grupos de informação, material de divulgação, cartilhas lindas, ilustradas. Desapareceu tudo. Eu acho que a gente guinou da ideia de integralidade para uma ideia de aumento de consumo de exame e medicamento. Essa atitude educativa diminui lucros e os pacientes ficam mais exigentes. Às vezes o profissional nem tem má fé, ele realmente acredita naquilo. As pesquisas indicam que entrar em trabalho de parto aumentam muito o risco de você sofrer violência. É muito interessante o grau de hostilização da mulher em trabalho de parto. Seja no SUS, por conta do conjunto de intervenções agressivas ou no setor privado porque elas acham o fim da picada que aquela mulher esteja querendo dar problema, dar trabalho para eles. Eu já ouvi uma mulher dizer que como insistiu muito com o médico que queria parto normal ele indicou um psicólogo dizendo que ela tinha traços masoquistas!

Vai acontecer essa mudança?

Só se partir das mulheres. Quando as pessoas se derem conta desses impactos sobre o bebê, creio que pode mudar."

Por Simone Diniz, médica obstetra PhD

Ela é considerada uma das pesquisadoras mais importantes em saúde materna no Brasil. Parte da coordenação do estudo “Nascer no Brasil”, que faz um panorama de como se nasce no país, ela dá números e declarações novas e impactantes nesta entrevista exclusiva à Pública, para a reportagem "Na hora de fazer não gritou"

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

E na hora de escolher uma parteira?

Por Maíra Libertad Soligo-Takemoto (enfermeira obstétrica)

Rio de Janeiro
O parto é um momento único na vida de uma mulher e de uma família. Escolher com cuidado quem estará ao seu lado, para te dar apoio ou ajudar em caso de necessidade, é uma tarefa delicada, que envolve entender primeiramente o que você deseja para o seu parto e, em seguida, procurar por alguém que possa oferecer o cuidado que você tem em mente (e merece!). Os critérios que as mulheres usam para escolher suas parteiras para um parto domiciliar são muito pessoais, mas algumas informações objetivas podem ajudar a definir se vocês estão na mesma sintonia. Ler relatos e pedir recomendações (para amigas, para a doula ou em grupos de discussão, por exemplo) são estratégias úteis, mas uma conversa franca e aberta, olho no olho, sobre seus desejos e necessidades e sobre as experiências e práticas da parteira é, sem dúvida, o canal mais adequado para isso.

As perguntas abaixo foram baseadas, adaptadas e modificadas a partir deste post aqui do blog Birth Without Fear: http://birthwithoutfearblog.com/2013/01/01/44-questions-for-your-midwife/. Não se trata de um checklist ou lista ideal de questões, já que cada mulher vai questionar aquilo que mais se afina com seus desejos e necessidades. Mas é sempre bom ter um ponto de partida!

Antes de qualquer coisa... Questões para você!
  1. O que você deseja para o seu parto? Você tem um plano de parto?
  2. De que coisas você não abriria mão?
  3. Como você imagina que vá se sentir nesse momento?
  4. Que tipo de pessoa/profissional você visualiza ao seu lado durante o parto?
  5. Como é o apoio/suporte/cuidado que você espera receber?
Sugestões de questões para discutir com a parteira
  1. Há quanto tempo você trabalha com partos? E partos domiciliares, especificamente?
  2. Quantos partos domiciliares você já atendeu? Posso entrar em contato com algumas dessas mulheres? Você tem relatos, filmes ou fotos?
  3. Qual sua formação? Onde? Quais cursos?
  4. Você participa de algum grupo ou entidade de profissionais? Costuma discutir casos ou pedir segunda opinião?
  5. Você tem treinamento em emergências obstétricas? E reanimação neonatal?
  6. Quantos partos você acompanha por mês? Você tem algum compromisso (viagem, férias, congresso etc.) planejado para meu período provável de parto?
  7. Em caso de imprevisto ou impossibilidade de atender ao meu parto, qual é o seu procedimento?
  8. Você trabalha com backup ou assistente? Quem são as pessoas que compõem sua equipe? Posso conhecê-las antes do parto?
  9. Você trabalha com doulas? Eu posso escolher minha própria doula ou você trabalha com alguma na equipe?
  10. Você trabalha com fotógrafa de parto? Eu posso escolher minha própria fotógrafa ou você trabalha com alguma na equipe?
  11. Eu pretendo ter meus familiares (X, Y e Z) presentes no parto comigo. Você tem alguma objeção à participação das pessoas que eu escolher? Familiares e amigos, por exemplo?
  12. Que equipamentos e materiais você traz para o parto? E medicamentos?
  13. Que materiais eu precisarei providenciar?
  14. Como é o seu acompanhamento pré-natal? Eu precisarei visitar um obstetra também?
  15. Que exames você pede durante a gestação, em geral?
  16. Qual é a sua taxa de transferência para o hospital? Quais as principais razões?
  17. Você já teve alguma complicação grave? Qual? Qual foi o desfecho? E óbito (de mãe ou bebê)?
  18. Quais procedimentos você realiza de rotina durante o trabalho de parto?
  19. Quando você considera importante realizar exames de toque? Eu posso recusá-los?
  20. Você faz episiotomias de rotina? Você considera que há alguma situação em que a episiotomia é importante? Qual?
  21. Qual é sua prática em relação a: puxos dirigidos, posição para o parto, kristeller (manobra de empurrar a barriga), soro com ocitocina em casa, momento do clampeamento do cordão, contato pele a pele etc.? [listar as que forem importantes para você]
  22. Quais as situações ou fatores de risco na gestação que me impediriam de ter um parto domiciliar?
  23. Se eu for transferida para o hospital ou para o cuidado de um obstetra, você vai continuar me acompanhando?
  24. E se eu passar das 41 ou mesmo das 42 semanas? Qual a sua conduta nesses casos? Eu ainda poderei parir em casa? Você recomenda indução? Quando?
  25. Qual é sua conduta em relação ao rastreamento do streptococcus do grupo B? Eu posso escolher não fazer o exame? E se der positivo, eu terei que parir no hospital?
  26. Você tem experiência com partos normais depois de cesárea (uma ou mais de uma)? E pélvicos? E gemelares? [listar outras situações em que você se encaixe ou que te preocupam]
  27. Como é seu acompanhamento pós-parto? Você ajuda com a amamentação, se necessário? Após o parto, eu precisarei ter uma avaliação imediata de um pediatra? Em que situações?
  28. Quanto você cobra? Em que momento será feito o pagamento? (antes ou após o parto, por exemplo)
  29. Você aceita parcelar? Qual é sua política de reembolso se eu decidir mudar de profissional ou desistir do parto domiciliar? E se eu for transferida?
Outras questões para você pensar :)
  1. Você conseguiu perguntar tudo que queria? Questionar e colocar suas vontades? Por quê? Por que não?
  2. Como você se sentiu em relação ao parto enquanto conversava com essa profissional ou depois da conversa? Mais ou menos empolgada, mais ou menos ansiosa do que o normal?
  3. Você gostou da visita? Foi agradável?
  4. Se havia outras pessoas da sua família presentes, como foi a experiência para elas? Como foi a interação entre a parteira e essas pessoas?
  5. Você sentiu que a parteira ficou incomodada ou intimidada com suas perguntas e seu nível de informação como consumidora?
(Maíra Libertad Soligo-Takemoto)

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

A armadilha da mulher maravilha

Original na fanpage de O Renascimento do Parto - o Filme
Por Dr. Daniel Becker (médico pediatra)

(Foto por John Hende em Uganda)

- Nasce um bebê no Xingu. Todas as mulheres da oca se mobilizam. A mãe está cercada de cuidados e apoio.

- Nasce um bebê no sertão das Minas Gerais. A avó, a bisavó, as tias, a prima cercam a mãe de cuidados.

- Nasce um bebê numa aldeia africana. Numa tribo em Maui. Numa cidadezinha no interior da Tailândia ou da Polônia ou da Inglaterra – a cena se repete. Na favela da Zona Norte as vizinhas e a tia que mora na laje de cima se encarregam de ajudar. E nas mansões dos jardins? Não são mais a avó e as vizinhas, mas as duas babás, a enfermeira, a faxineira, o motorista e o segurança.

Nasce um bebê em Copacabana, no apartamento 1104. A avó está trabalhando em tempo integral. O pai só tem cinco dias de licença. A vizinha do 1103 não só não ajuda, como sequer conhece, e ainda reclama do choro noturno. E a empregada diz que só ganha pra cuidar da casa. Ajudar à noite, nem pensar.

E aí temos esse fascinante fenômeno social: a única mulher do planeta que é deixada pra cuidar de um bebê sem nenhuma ajuda é a da classe media, urbana, ocidental. Pior: ela achava que ia conseguir…

Mas essa onipotência (culturalmente induzida, claro – e muitas vezes socialmente exigida…) só dura até o 5o dia, quando muito. Na segunda semana a mulher percebe que um bebê demanda demais. Precisa de atenção 24 horas, permanente. Que os intervalos do sono não são suficientes para que ela viva: descanse, almoce, tome um banho, respire, olhe pela janela, durma meia hora, atenda ao telefone, responda um email. E os cuidados muitas vezes exigem duas pessoas. Sem ajuda, é virtualmente impossível. A amamentação facilita e muito o cuidado, já que não é preciso tratar de mamadeiras, latas, esterilizadores e bicos. Mas é preciso tempo e descanso para produzir leite. É o clássico bordão, muitas vezes ignorado: um bebê só ficará bem se sua mãe estiver bem. Em alguns momentos, é crucial que a mãe volte a ser mulher – um indivíduo separado de sua filha, que precisa descansar, se cuidar, relaxar, pensar em outras coisas. Ela precisa desses momentos como o bebê precisa do seu leite.

Por isso, é preciso que tenhamos menos onipotência, e que reconheçamos que vamos sim precisar de ajuda. Para isso, é necessário planejamento: quem vai ajudar, como, quando. O pai vai segurar a onda nas noites? Até quando? A avó pode mesmo ajudar? E os conflitos que tantas vezes surgem nesse momento? Uma coisa é apoiar, acolher; outra, se intrometer ou criticar – fronteira sutil e muitas vezes rompida de forma inconsciente e perversa. A empregada vai cuidar da casa? Vai ter comida pronta? O patrão vai respeitar e não ligar para falar de trabalho?

Nos dias de hoje, a situação se complica ainda mais. Em nossos tempos hiper-conectados, de distrações múltiplas e permanentes e com enorme apelo, é dificílimo estarmos concentrados em uma tarefa. Muitas vezes a futura mãe se ilude e acha que vai amamentar, trocar fraldas, ver a novela, passar email de trabalho, estudar para o concurso e postar no Facebook, ao mesmo tempo, já nos primeiros dias de vida do recém nascido.

E como se a situação em si já não fosse complicada o suficiente, aparecem outros obstáculos: o marido quer ensinar a colocar o bebê no seio (com a melhor das intenções), dizendo que ela está fazendo errado; a mãe (avó do bebê) diz “mas o que custa dar uma mamadeirinha, ele chora tanto”; as amigas dizendo que pra elas foi muito simples, que fizeram assim ou assado e que você está fazendo tudo errado; a prima exibicionista cujo bebê dorme bem, mama bem e “não dá nenhum trabalho”…. e a sociedade toda dizendo que se você não consegue amamentar seu bebê e cuidar dele integralmente, é porque não tem competência.

Reproduzo aqui um depoimento da Chris Nicklas em seu site:

“Amamentar é…” que descreve essa situação de forma muito concreta e emocionante:

“Tantas pessoas entraram na minha casa com a intenção de ajudar! Nossa, nem sei dizer… Quantas realmente me ajudaram? Conto nos dedos!

Qual será o problema? Por que é tão difícil se abrir para enxergar o que o outro precisa?

Me recordo de uma situação em específico. Eu com o mamilo esquerdo inflamado sofrendo por ainda sentir dores no aleitamento materno, apesar dos meus filhos já estarem com três meses. As pessoas passando por mim dizendo barbaridades do tipo:

- É assim mesmo, vai calejar…

- Dê a mamadeira! Olha o que você está fazendo com você mesma, pra quê?

- Dê o peito assim mesmo! Não pode estar doendo tanto assim!
As horas passando e o meu desespero aumentando. Minha consulta médica já estava marcada. Mal eu sabia que estava com sapinho e por isso voltava a ser dolorido amamentar. Meu estado emocional não me permitia enxergar um palmo na frente do nariz!
Muito bem, numa certa altura chega minha sogra em casa. Me olha e fica devastada com o meu estado. Minha cara era de puro desconsolo. De repente ela me lança a seguinte pergunta:

- Minha filha, o que você precisa? Me diga o que fazer para te ajudar…

Meus olhos se encheram de lágrimas. Uma pergunta tão simples e tão rara de se ouvir.

Ficamos ali nos olhando, enquanto meu coração transbordava de tantos sentimentos e emoções.”

O que a mulher precisa no momento da amamentação é apoio de verdade. Apoio aberto, honesto e atento. Ela não precisa de crítica, ensinamentos verticais, lições de moral ou prescrições autoritárias. Muito menos de conselhos sobre mamadeiras. Ela precisa de espaço psíquico, tempo e um mínimo de estrutura para se dedicar ao bebê. E de apoio técnico, prático, de que falaremos mais adiante.

Aliás, esse é um importante papel que o pai pode exercer nesse momento da vida familiar, o nascimento de um filho. Tão ou mais importante quanto trocar fraldas, ninar e dar banho, é garantir que o binômio mãe-bebê vai ter paz e tranquilidade para se conhecer, se conectar, evoluir em direção a um bom desenvolvimento e a uma amamentação bacana. Para isso, cuidar da casa, e garantir que esteja em ordem; comida na geladeira e contas em dia; atender o telefone e dar conta dos palpiteiros; receber as visitas e oferecer as desculpas pois a mamãe agora está descansando… e estar atento às necessidades da sua mulher.

Gosto de comparar a família neste momento do ciclo vital com o átomo: no núcleo central, mãe e bebê recém nascido – próton e nêutron – numa relação de simbiose e magnetismo. Em torno deles, o elétron, não diretamente envolvido na troca nutritiva mas fundamental no equilíbrio de energias, nas trocas afetivas, no cuidado com a família."

Por Dr. Daniel Becker (médico pediatra)

Para saber mais do trabalho do Dr Daniel Becker:

https://www.facebook.com/pediatriaintegral?fref=ts

terça-feira, 26 de agosto de 2014

O Puerpério - Por Laura Gutman

(tradução livre de Flavia Penido)
Original em Bebedubem - Vila Mamífera

Vamos considerar o puerpério como o período que transita entre o nascimento do bebê e os dois primeiros anos, ainda que emocionalmente haja um progresso evidente entre o caos dos primeiros dias – em meio a um pranto desesperado- e a capacidade de sair ao mundo com um bebê nas costas.
Para tentarmos submergir nas difíceis trilhas energéticas, emocionais e psicológicas do puerpério, creio necessário reconsiderar a duração real deste trânsito. Refiro-me ao fato que os famosos 40 dias estipulados – já não sabemos por quem nem para que - tem a ver só com o histórico veto moral para salvar a parturiente do pedido (reclamo) sexual do varão. Mas esse tempo cronológico não significa psicologicamente um começo nem um final de nada.
Minha intenção – pela falta de um pensamento genuíno sobre o “si mesmo feminino” na situação de parto, lactação, criação e maternagem em geral- é desenvolver uma reflexão sobre o puerpério baseando-nos em situações que às vezes não são nem tanto física, nem visível, nem tão concreta, mas não por isso são menos reais. Vamos falar em definitivo do invisível, do submundo feminino, do oculto. Do que está mais além do nosso controle, mais além da razão para a mente lógica. Tentaremos nos aproximar da essência do lugar onde não há fronteiras, de onde começa o terreno do místico, do mistério, da inspiração e da superação do ego. Para falar do puerpério, teremos que inventar palavras, ou outorgá-las um significado transcendental.
Para nós, que já o temos transitado faz muito tempo, nos dá preguiça voltar a recordar esse lugar tão desprestigiado, com reminiscências à tristeza, sufoco e desencanto. Recordar o puerpério equivale frequentemente a reorganizar as imagens de um período confuso e sofrido, que engloba as fantasias, o parto tal como foi e não como havia querido que fosse, dores e solidões, angústias e desesperanças, o fim da inocência e o início de algo que dói trazer outra vez a nossa consciência. Para começar a armar o quebra-cabeça do puerpério é indispensável ter em conta que o ponto de partida é o parto, quer dizer, a primeira grande desestruturação emocional. Como descrevi no livro “Maternidade e o encontro com a própria sombra” para que se produza o parto necessitamos que o corpo físico da mãe se abra para deixar passar o corpo do bebê, permitindo uma certa “ruptura” corporal também se realiza em um plano mais sutil, que corresponde a nossa estrutura emocional. Há um algo que ''se quebra'', ou que se “desestrutura” para conseguir a passagem de “ser um a ser dois”.
É uma pena que atravessamos a maioria dos partos com muito pouca consciência com respeito a este “rompimento físico e emocional”. Já que o parto é sobretudo um corte, uma quebra, uma brecha, uma abertura forçada, igual à irrupção do vulcão (o parto) que geme desde as entranhas e que ao lançar suas partes profundas destroem necessariamente a aparente solidez, criando uma estrutura renovada.
Depois da “erupção do vulcão” nós as mulheres, encontramos com o tesouro escondido (um filho nos braços) e, além disso, com insólitas pedras que se desprendem como bolas de fogo (nossos “pedacinhos emocionais”, ou nossas partes mais desconhecidas) rodando em direção ao o infinito, ardendo em fogo e temendo destruir o que roçamos. Os “pedacinhos emocionais” vão queimando o que encontram a seu caminho. Olhamos atordoadas, sem poder crer a potência de tudo o que vibra em nosso interior. Incendiando e caindo no precipício, costumam manifestar-se no corpo do bebê (como uma planície de pasto úmido aberta e receptora). São nossas emoções ocultas que desdobram suas asas no corpo do bebe saudável e disponível.
Como um verdadeiro vulcão, nosso fogo roda por todos os vales receptores. É a sombra, expulsa do corpo.
Atravessar um parto é preparar-se para a erupção do vulcão interno, e essa experiência é tão avassaladora que requer muita preparação emocional, apoio, acompanhamento, amor, compreensão e coragem por parte da mulher e que de quem pretende assisti-la. Todavia poucas vezes nós as mulheres encontramos o acompanhamento necessário para introduzir-nos logo nessa ferida sangrenta, aproveitando esse momento como ponto de partida para conhecer nossas renovadas estrutura emocional (geralmente bastante maltratada, por certo) e decidir o que faremos com ela.
O fato é que - com consciência ou sem ela, acordadas ou dormindo, bem acompanhadas ou sós, incineradas ou a salvo - o nascimento se produz. Lamentavelmente hoje em dia consideramos o parto e o pós-parto como uma situação puramente corporal e de domínio médico. Submetemo-nos a um trâmite que com certa manipulação, anestesia para que a parturiente não seja um obstáculo, droga que permitem decidir quando e como programar a operação e uma equipe de profissionais que trabalham coordenados, possam tirar o bebê corporalmente são e felicitar-se pelo triunfo da ciência. Estas modalidades estão tão arraigadas em nossas sociedades que nós mulheres nem sequer nos questionamos se fomos atrizes de nossos partos ou meras expectadoras. Se foi um ato íntimo, vivido desde a mais profunda animalidade, ou se cumprimos com o que se esperava de nós. Se foi possível transpirar ao calor de nossas chamas ou se fomos retiradas da cena pessoal antes do tempo.
Na medida em que atravessamos situações essenciais de ruptura espiritual sem consciência, anestesiadas, dormidas, infantilizadas e assustadas… ficaremos sem ferramentas emocionais para rearmar nossos pedacinhos de chamas, permitindo que o parto seja uma verdadeira transição de alma. Frequentemente assim iniciamos o puerpério: afastadas de nós mesmas.
Anteriormente descrevíamos a metáfora do vulcão na chama, abrindo e rachando seu corpo, deixando a descoberto a lava e as pedras. Analogamente do ventre materno urge o bebê real, e também o interior desconhecido dessa mamãe, que aproveita o rompimento para correr pelas fendas que ficaram abertas. Esses aspectos ocultos encontram uma oportunidade para sair do refúgio. A sombra (quer dizer, qualquer aspecto vital que cada mulher não reconhece como próprio, a causa da dor, o desconhecimento ou o temor) utiliza a ruptura para sair de seu esconderijo e apresentar-se triunfante na superfície.
O problema para a mãe recente é que se encontra simultaneamente com o bebê real que chora, demanda, mama, se queixa e não dorme… e ao mesmo tempo com sua própria sombra (desconhecida por definição) , inabarcável e indefinível. Porém concretamente com que aspectos de sua sombra se encontram? Cada ser humano tem sua personalíssima historia e obstáculos a recorrer, portanto só um trabalho profundo de introspecção, busca pessoal, encontro com suas dores antigas e coragem poderá guiar-nos até o interior dessa mulher que sofre através da criança que chora.
O puerpério é uma abertura de alma. Um abismo. Uma iniciação. Se estivermos dispostas a submergir nas águas de nosso eu desconhecido.
Laura Gutman (tradução livre Flavia Penido)

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Encontro Gestar: contexto histórico do nascer

O nascer em diferentes culturas e contextos históricos: desconstruindo mitos e 'verdades'.

Próximo encontro Gestar, dia 21.08 às 19 horas.

"Numa sociedade construída com bases patriarcais ficou relegado às mulheres um papel de subalternidade.

Tal situação é decorrente das relações de gênero, que determinam de modo cultural (e não natural) uma distribuição desigual de poder entre os sexos.

Essa desigualdade reflete na forma como sentimos e pensamos o que é ser mulher, o que é ser mãe...

Muitos mitos foram construídos e transformados em verdades - que podem e devem ser desconstruídas.

Através da história (não a das verdades prontas, mas sim da reflexão e análise de diferentes contextos e culturas) é possível atingir um nível de consciência sobre os processos que nos constituíram e nosso lugar nessa sociedade!"

(Daniela Sbravati)

Mediação e construção de argumentos: Daniela Sbravati, doutoranda em história e Luisa Tombini Wittmann, doutora em história.

Encontro aberto e gratuito...

Esperamos por você!


domingo, 10 de agosto de 2014

Vamos celebrar a paternidade consciente e participativa!

Dia 10 de agosto: Feliz dia dos pais, dos cuidadores!!

Paternidade honesta, participativa e feminista


Paternidade honesta, participativa e feminista

Por Jarid Arraes, original em Revista Forum
Em uma cultura voltada para o consumo e que relaciona a compra de presentes com demonstração de afeto, uma data comemorativa e comercial como o Dia dos Pais não é um alvo frequente de debates e reflexões. Porém, indo além da óbvia crítica ao teor consumista da data, o Dia dos Pais pode ser uma oportunidade para que os homens reflitam sobre o que é ser um pai verdadeiramente responsável e cuidador, ultrapassando o papel clichê do “pai que ajuda”.
O “pai que ajuda” é bastante valorizado pela sociedade; é aquele pai que segura o bebê enquanto a mãe vai ao banheiro, que troca uma fralda ou mesmo que busca a criança na escola. Esses pais, que vão um pouco além do papel de provedor financeiro, são amplamente celebrados: “Meu marido é um ótimo pai, me ajuda com o bebê” é uma frase proferida com frequência, como se trocar a fralda de um bebê fosse uma atividade extremamente antinatural aos homens. Mas será que a paternidade se resume a essas tarefas tão ocasionais?
A paternidade não é nenhum fenômeno místico totalmente diferente da maternidade, simplesmente porque não há papéis exclusivos de um determinado gênero quando o assunto é educar e cuidar das crianças. Se responsabilizar por uma criança, educá-la, alimentá-la e providenciar-lhe saúde e afeto são responsabilidades sociais de qualquer pessoa humana que tenha filhos. Por isso, ter um filho e criá-lo com amor não é algo que as mulheres têm mais predisposição a fazer – e nem deve ser um privilégio exclusivo de casais heterossexuais. Na verdade, ter um filho e uma família não é e nem nunca foi uma exclusividade de casais, já que há tantas famílias com configurações diversas, por vezes chefiadas por tios ou avós, ou simplesmente compostas por outros parentes. Portanto, o homem que elege a mulher como mais apta a cuidar de uma criança não está sendo coerente com a realidade: trata-se somente de uma fuga de suas responsabilidades paternas devido a sua falta de empenho em ser participativo na vida dos filhos.
Ao contrário dos valores tão enraizados em nossa cultura, os homens não são insensíveis demais e nem possuem menos habilidade para cuidar de crianças. É certo que cada indivíduo, independente de seu gênero, possui mais facilidade para algumas tarefas do que para outras – algo que também é válido para as mães. Sob esse ponto de vista, o homem que tem um filho é absolutamente capaz de ser responsável por aquela vida. A presença paterna deve ir além das tarefas esporádicas e o pai pode e deve colocar seu filho para dormir, cozinhar seus alimentos, administrar remédios e levá-lo ao médico, mesmo que essas atividades não sejam prazerosas. Demonstrar amor com palavras, beijos e brincadeiras faz parte de uma paternidade responsável e comprometida, mas não é nem de longe suficiente para que a criança se sinta querida, importante e segura.
Além de tudo, a importância da paternidade está em seu enorme potencial de fazer a diferença no mundo, ainda tão calejado de tantos séculos marcados pelo machismo. O pai que participa, seja ele heterossexual ou não, casado ou não, é aquele que faz de seu exercício paterno uma oportunidade para estabelecer valores de igualdade, respeito e responsabilidade dividida entre todos aqueles que escolhem ter crianças em suas vidas. Esse é o pai que ensina, por meio de um exemplo diário e concreto, que homens e mulheres são equivalentes e livres. Pensando nas relações de gênero e em como os paradigmas do machismo são ensinados às crianças,  a equidade de gênero no ambiente familiar é muito mais do que dar uma simples ajudinha; um dia essas crianças se tornarão adultas e, durante esse processo, serão fortes reprodutoras dos valores feministas aprendidos, também, com seus pais.
Foto de capa: Pixabay

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

O que o seu anticoncepcional tem a ver com o meu feminismo?

Texto de Ticiane Figueiredo, original em Blogueiras Feministas

É muito simples, basta ir a qualquer farmácia munida de uma receita médica e comprá-lo. Ou nem isso, com uma receita específica, você pode adquiri-lo gratuitamente no SUS.
Ambas alternativas são, de certa forma, cômodas. Talvez seu único protesto se resuma ao preço que irá pagar ou a fila que irá pegar para enfim ter seu remédio. Toda a história por trás do anticoncepcional ou toda a luta de “certas mulheres” não fazem diferença para você porque hoje você o tem, hoje você pode tê-lo. Você pode decidir se quer usá-lo ou não. A escolha é sua e de ninguém mais. E eu fico feliz por você, por poder decidir, mas infelizmente não foi sempre assim e por mais que você ignore os fatos e não se importe com as conquistas feministas, você não vive em um presente contínuo, houve um passado. Um passado de lutas.
O uso do anticoncepcional, às vezes recomendado por ginecologistas para controle hormonal, está diretamente ligado à sexualidade da mulher. Está sobretudo ligado a uma escolha: “ser ou não ser mãe?”.
Por muito tempo, e ainda hoje, infelizmente, a liberdade sexual da mulher sempre foi limitada, isto é, quando existia alguma. Seja pelo fato do próprio sexo ter sido por muito tempo um tabu, ou devido ao papel imposto pelo patriarcado à Mulher, essa era uma das coisas das quais ela era privada: o prazer carnal. Não bastasse a pressão social e religiosa, havia ainda outra problemática: a mulher engravidava. E diferentemente do que muitos pensam, a maternidade é uma escolha e não uma conseqüência de ser/nascer mulher. Logo, o anticoncepcional, assim como outros métodos contraceptivos, foram um marco para a autonomia da mulher sobre o seu próprio corpo e seus próprios desejos. Nós também gostamos de sexo, afinal.
Foi aproximadamente na década de 60, marcada pela entrada em massa das mulheres nas universidades e a grande difusão da liberdade sexual, que a feminista Margaret Sanger procurou o então biólogo Gregory Goodwin Pincus com a idéia de criar um remédio que pudesse dar às mulheres o poder e a autonomia sobre seu corpo, ou seja, ter ou não filhos. Pincus acatou a ideia e seguiu com a pesquisa às escondidas, pois o uso de contraceptivos ainda era tido como ilegal na época. Anos depois a primeira pílula surgiu, e apesar de muita relutância da igreja e da própria sociedade, foi legalizada.
Foto de Jenny Lee Silver no Flickr em CC, alguns direitos reservados.
Foto de Jenny Lee Silver no Flickr em CC, alguns direitos reservados.
Mas que pílula mágica era essa, afinal? Como substâncias sintéticas que inibiam a ovulação podiam dar às mulheres o poder de decidir quando ter filhos e quantos ter? Simples, o anticoncepcional não era só um contraceptivo, era uma ideia. Uma ideia estranha de que as mulheres podiam ter autonomia sobre o seu próprio corpo. Um corpo que não era nem do Estado, nem da Igreja, nem do marido, mas sim delas. E elas agora podiam usar e abusar dele com mais liberdade graças às lutas feministas pela difusão e legalização do referido método.
Hoje a luta continua. O direito ao uso do anticoncepcional é nosso. Meu, seu, de tod@s nós. Seja você feminista ou não. Mas infelizmente aquela idéia de autonomia sobre o próprio corpo ainda não é muito aceita pela “sociedade” patriarcal e machista. Essa idéia é uma das principais bandeiras do Feminismo. Sim, aquele feminismo-que-não-tinha-nada-a-ver-com-você, mas que conseguiu muitos dos direitos que você possui hoje. Ele mesmo.
Infelizmente, apesar de todo o seu peso em nossa emancipação sexual, a pílula apresenta alguns efeitos colaterais que estão sendo muito questionados. Afinal, é um hormônio sintético, aplicado ao seu corpo todo mês. Isso sem falar na grande polêmica que envolveu a pílula Diane 35 devido às mortes por trombose venosa. E é aí que aquele Feminismo-que-não-tinha-nada-a-ver-com-você surge novamente com um interessante questionamento: E a responsabilidade do homem?
Levantar esta questão é de suma importância porque, ao tomar a pílula e ao assumir os riscos – tanto relacionados à saúde quanto à gravidez – que essa decisão envolve, a mulher parece ser a única responsável pelas conseqüências que podem vir a surgir. Afinal, quem foi que esqueceu de tomar a pílula, não é mesmo? Parece muito simples endossar esse discurso, principalmente se estivermos diante de uma sociedade patriarcal e capitalista. Mas não é bem assim que funciona.
O homem é tão responsável quanto a mulher, seja com relação a tudo o que envolve uma vida sexual a dois — casual ou não —, seja com relação às atividades domésticas e laborais. Até porque, o ‘filho da mãe’, se nascer, é do pai também. E esse falso moralismo que condena a sexualidade da mulher e a enxerga como uma culpada por todas as pragas do mundo, não passa de um machismo e como tal, deve ser combatido!
Assim, todos os dias quando for tomar a sua sagrada pílula, ou injeção, lembre-se da nossa luta e se quiser, junte-se a ela. Afinal, se uma simples pílula conseguiu fazer uma revolução, imagine o que você não seria capaz de fazer!